*Aylla Kipper
Quando falamos em gestão de resíduos sólidos surge a dúvida sobre o que são. Por isso, antes de tratar diretamente sobre a gestão, vale salientar que resíduos sólidos são materiais ou substâncias produzidas por diversas atividades humanas que, após o uso, podem ser direcionados a processos de transformação. Por isso, são diferenciados de rejeitos, conforme definição apresentada pela Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS).
Esses resíduos podem ser domiciliares, industriais ou de limpeza urbana. Cada tipo de resíduo determina como ele deve ser tratado e reaproveitado. Para que a destinação correta desse resíduo seja aplicada e os setores econômicos desenvolvam alternativas para a coleta e o tratamento de resíduos pós consumo, existe a PNRS, lei que completou dez anos em 2020. Mas, mesmo após esse tempo, há ainda dificuldades para implementação das regras.
Instituída pela lei 12.305/2010, a PNRS estabelece os instrumentos para avanços na gestão e no gerenciamento dos resíduos sólidos no território nacional, mediante articulação entre as diferentes esferas do poder público com o setor empresarial, com o propósito de cooperação para atender o objetivo da lei, que de uma forma geral é garantir a proteção da saúde pública e da qualidade ambiental. Mas para atingir essa meta, são diversos os pilares necessários, como a não geração, redução, reutilização e reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos.
A PNRS estabelece ainda, entre os objetivos, o estímulo à adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços, a adoção, desenvolvimento e aprimoramento de tecnologias limpas como forma de minimizar impactos ambientais; e o incentivo ao desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental e empresarial voltados para a melhoria dos processos produtivos e ao reaproveitamento dos resíduos sólidos.
O caminho é longo, entretanto. Para se ter uma ideia, a média de reciclagem no Brasil não passou de 3,7% em 2019, segundo o Índice de Sustentabilidade da Limpeza Urbana (ISLU). De acordo com o índice, as regiões que menos reciclam são Nordeste, Norte e Centro-Oeste, onde os índices não ultrapassam os 2%.
Há diversas regras para a coleta e o descarte legal dos resíduos, principalmente para que sejam estudadas formas de transformação. Assim, possibilitam que o resíduo volte ao uso, com o que chamamos de valor agregado, ou seja, reinserido para uma nova função, criando a cadeia de economia circular. A ideia é valorizar os processos de reciclagem, gerando o mínimo de lixo. Entretanto, um dos grandes problemas encontrados está justamente no início dessa operação, isto é, na separação e destinação adequada pela sociedade.
Dando foco no papel das pequenas, médias e grandes indústrias, que são geradoras de resíduos sólidos em alta quantidade, estudos indicam que, como muitas empresas estão em regiões distantes, principalmente do interior, o custo para solicitar a coleta de resíduos é alto, já que se analisa o peso e a quilometragem para esse cálculo.
Por isso, infelizmente, algumas empresas optam pelo formato mais fácil, que acaba sendo prejudicial ao meio ambiente. Descartam esses resíduos como forma de rejeito, o que faz com que muitos materiais que podem ser transformados em novos produtos não sejam. Além disso, há as coletas clandestinas, que impedem que os resíduos gerem economia circular e tenham uma nova vida útil, pois acabam sendo descartados diretamente no meio ambiente ou em lixões, o que pode causar grandes impactos ambientais.
Ou seja, para que haja uma gestão de resíduos sólidos segura, o ponto principal é agir para que os consumidores separem adequadamente os resíduos pós consumo e que a coleta chegue aos locais geradores dos resíduos. Para a coleta dois fatores são importantes: primeiro que os geradores se atentem em certificar se o resíduo terá o destino ideal. Uma das formas de identificar isso é por meio do Certificado de Coleta, que possibilita a rastreabilidade da cadeia de custódia e certidões de destinação correta.
O outro fator parte dos poderes de fiscalização. O Ministério Público tem em sua estrutura órgãos capazes de auxiliar nas demandas de implementação e fiscalização ambiental e sanitária. Entretanto, é evidente que há uma defasagem nessa questão, já que, infelizmente, notamos a existência do mercado ilegal que envolve desde a coleta, até pontos de lixões e aterros irregulares pelo país.
Para que essas ações sejam colocadas em prática e, principalmente, qualificar a fiscalização, os Estados precisam agir em conformidade com a PNRS. O Estado de São Paulo, por exemplo, desde 2006 conta com a Política Estadual de Resíduos Sólidos (PERS), Lei nº 12.200/2006, que mantém um conjunto de princípios e diretrizes para a gestão dos resíduos sólidos gerados no território. E entre os agentes fiscalizadores tem a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), que atua no monitoramento das atividades geradoras de poluição.
Já em 2014 foi lançado o Plano de Resíduos Sólidos do Estado. O documento une ações em conformidade com a lei para aplicação pública e privada. Inclusive, estava em consulta pública até novembro desse ano. Dessa forma, tanto a sociedade civil quanto as empresas que atuam no setor poderiam se manifestar por meio de questionamentos e sugestões de ações.
Diante do cenário atual e das discussões acerca da gestão de resíduos do país, sabemos que ainda temos um longo caminho para atingir os níveis esperados de coleta, recuperação e reciclagem desses resíduos sólidos, considerados pós-consumo. Mas é importante estarmos alinhados com as novas tecnologias e possibilidades de transformações desses itens para, assim, garantirmos que essa gestão de resíduos atinja os resultados de sustentabilidade que precisamos para um futuro melhor.
*Aylla Kipper é gerente de relações institucionais e sustentabilidade da Lwart Soluções Ambientais e vice-presidente da AMBIOLUC, entidade que representa a logística reversa do setor de rerrefino de óleo lubrificante usado no País.